Em entrevista concedida a ZENIT, a professora de arte Cristina Langer falou sobre a beleza da liturgia. Ela tratou do mesmo tema em conferência no Simpósio Teológico comemorativo do centenário da diocese de Ribeirão Preto (São Paulo).
Recomendo a leitura completa dessa entrevista, mas aqui gostaria de ressaltar dois pontos.
Afirma a professora Cristina que "Na Liturgia a beleza é o próprio motivo pelo qual a celebração se dá: para Deus, com Ele e Nele. Qualquer motivo que não seja este esconde a Beleza presente ao invés de revelá-la".
Eis um conceito que está bastante deturpado atualmente: a Missa é para Deus, com Deus e em Deus. Hoje, por má fé ou por má formação, muitas vezes se celebra a Missa pensando-se mais em agradar o povo do que a Deus, esquecendo do fim principal dela.
E, conforme afirma a professora Cristina, quando tristemente se perde essa referência, ou melhor, quando se troca essa referência, quando Deus deixa de ser o centro, toda a beleza da liturgia se esvai...
Esse ponto me fez lembrar algo que li na biografia do Papa escrita pelo vaticanista Andrea Tornielli: "Bento XVI - O Guardião da Fé". Nesse livro o autor cita vários trechos de livros escritos pelo então cardeal Jospeh Ratzinger, sendo que a citação abaixo consta em sua autobiografia (o destaque é meu):
"Deste modo, desenvolveu-se, de fato, a impressão de que a liturgia seja 'feita', que não seja algo cuja existência nos precede, algo que nos 'é dado', mas algo que depende das nossas decisões. Disto se segue, como consequência, que não se reconheça essa capacidade de decisão só aos especialistas ou a uma autoridade central, mas que, definitivamente, qualquer 'comunidade' queira se dar uma liturgia própria. Mas, quanda uma liturgia é algo que qualquer um faz por si mesmo, então desaparece aquela que é a sua verdadeira qualidade: o encontro com o mistério, que não é um produto nosso, mas a nossa origem e a fonte da nossa vida."
Essa perda da noção de mistério da Missa, de sua sacralidade e de que é, como ressalta Joseph Ratzinger, algo que nos precede, que não podemos manipulá-la livremente, pois a recebemos da Igreja, de Deus!, tem reflexos terríveis na fé do povo e na própria compreensão do que seja a Missa.
Por uma péssima interpretação da reforma desejada pelo Concílio Vaticano II e das possibilidades de escolha oferecidas pelo atual Missal, o que tem ocorrido com extrema frequência são liturgias criadas a partir de preferências do sacerdote, do liturgista ou do povo; menos liturgias conforme "nos foi dado" por aquela que é quem de fato determina o que deve e o que não deve ser feito: a Igreja.
Conforme tem sido feito, a beleza e o mistério da Missa desaparece... E o que fica? Ou melhor, o que substitui o mistério, "fonte de nossa vida"? Sim, porque o essencial da Missa sendo retirado ela deixa de atrair as almas, pois é Cristo elevado quem atrai (Jo 12,32). Ainda que a Eucaristia ainda esteja lá, tanto entulho é jogado sobre ela, que acaba por se perder suas inúmeras graças. Seria impossível listar aqui o que se antepõe à Eucaristia, tamanhã a criatividade aliada a desobediência: músicas barulhentas e muitas vezes heréticas, teatros, danças, confraternizações com "a pessoa que está do seu lado", etc... etc.. etc... E Deus? Se perdeu em meio a tanta criatividade...
"A liturgia não se tornará nova, pessoal e verdadeira, através de invenções de palavras e brincadeiras banais, mas sim pela coragem dos que se põe a caminho para alcançar o Imenso; aquilo que, através do rito, desde sempre nos precedeu e que nós nunca conseguiremos apanhar." (Introdução ao espírito da liturgia, Joseph Ratzinger, pg. 126, ed. Paulinas).
Um outro aspecto levantado pela professora Cristina diz respeito ao silêncio: "A própria Liturgia tem na sua sequência uma série de momentos de silêncio, que não são espaços vazios de tempo, mas espaços de tempo repletos da Presença. Ao preencher estes momentos com músicas ou palavras supérfluas, encobrimos o Essencial".
E como as músicas têm preenchido a liturgia... Músicas tem substituido até trechos que não poderiam ter suas letras alteradas, como o Glória e o Pai-Nosso! Ou ainda, quantas músicas são cantadas nas Missas com letras absolutamente heréticas! Cria-se até Missas para agradar gostos específicos, eu mesmo já tive a infeliz experiência de assistir a uma Missa Heavy-Metal.
Prova de que o essencial, Cristo, se perdeu é o fato de ser muito comum alguém afirmar que prefere essa ou aquela Missa por que "a banda é boa" ou o "padre é mais animado". Será que é isso que deve nos atrair na liturgia?
Cabe registrar aqui mais algumas das sempre sábias palavras do então Cardeal Ratzinger:
"O silêncio [na liturgia] deve ser um silêncio pleno, mais do que apenas a ausência de palavra e de ação. O que nós esperamos da liturgia é precisamente que ela nos dê tal silêncio positivo - o silêncio que não é apenas uma pausa, cheia de pensamentos e desejos, mas sim o momento de contemplação, que nos ofereça paz interior, que nos deixe respirar e que descubra o essencial que se encontra oculto. Por isso mesmo é impossível 'fazer' simplesmente silêncio, prescrevê-lo como uma outra ação. Não é por acaso que hoje se procuram tantos exercícios de meditação: é o surgimento de uma necessidade humana que não encontra satisfação na forma atual da liturgia" (Introdução ao espírito da liturgia, Joseph Ratzinger, pg. 154, ed. Paulinas).
Por fim, mais do mesmo para fechar:
"Cada vez menos é Deus que se encontra em destaque, cada vez mais importância ganha tudo o que as pessoas aqui reunidas fazem e que em nada se querem submeter a um 'esquema prescrito'." (Introdução ao espírito da liturgia, Joseph Ratzinger, pg. 59, ed. Paulinas).
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